Quando o Silêncio Grita: Os Efeitos da Negligência Emocional na Infância

Por Cristiane Borges
“Nem toda ausência é física. Às vezes, é emocional – e essa, quando constante, machuca em silêncio.”
O que é negligência emocional, afinal?
Nem sempre o abandono se apresenta de forma explícita. Às vezes, ele mora no cotidiano aparentemente normal: na falta de escuta, na ausência de olhar, no “depois a gente conversa” que nunca chega. A negligência emocional é exatamente isso – um cuidado que deveria existir, mas que simplesmente não acontece. É o silêncio no lugar do afeto. É a indiferença onde deveria existir conexão.
Não se trata de pais ruins, desinteressados ou cruéis. Muitas vezes, estamos falando de adultos sobrecarregados, que não aprenderam a lidar com emoções – nem as próprias, muito menos as dos filhos. Mas a dor que isso causa é real. E silenciosa.
O afeto também nutre
Fala-se com frequência sobre os cuidados físicos na infância. A importância da amamentação, a introdução alimentar bem planejada, a restrição de açúcar nos primeiros anos… Tudo isso é essencial, claro. Mas e o nutriente emocional?
Pouco se discute sobre isso, embora seja igualmente vital. Somos seres biopsicossociais – precisamos de comida, sim, mas também de colo, de escuta, de validação. Uma criança bem alimentada, mas emocionalmente negligenciada, pode crescer cheia de buracos invisíveis. E esses vazios, lá na frente, cobram um preço alto: insegurança, baixa autoestima, dificuldade de se vincular, medo de não ser suficiente.
Nutrir vai além do prato. Nutrir é também estar presente quando o choro vem sem motivo aparente, quando a criança não sabe nomear o que sente, quando ela precisa apenas de alguém que diga: “Está tudo bem sentir isso. Eu estou aqui.”
Pais presentes, mas emocionalmente ausentes
Quantas vezes você já se pegou dizendo: “Estou exausto. Não tenho tempo nem pra mim.”? Essa é a realidade de muitos pais. Trabalho, contas, rotina… Tudo isso suga tempo e energia. E sim, é compreensível.
Mas quando a correria vira regra e a conexão emocional vira exceção, algo se perde no caminho. A comida pode estar na mesa, a criança pode ter tudo o que precisa materialmente – mas dentro dela, cresce um vazio.
Aquela frase clássica, “Eu trabalho para dar o melhor para meus filhos”, precisa ser repensada. Porque melhor do que dar presentes é estrar presente na vida de quem dizemos amar.
As feridas que ninguém vê
A grande tragédia da negligência emocional é que ela não deixa marcas visíveis. Não há hematomas, gritos ou escândalos. Mas existe uma dor surda, constante, que se instala cedo e cresce junto com a criança.
Crianças que não são emocionalmente vistas aprendem, desde cedo, que o que sentem não tem importância. Elas se esforçam para agradar, para chamar atenção, para provar valor – mas vivem com a sensação de que nada é suficiente.
Essa dor pode se transformar em padrões destrutivos na vida adulta: medo da rejeição, relações instáveis, baixa autoestima, autossabotagem. É crescer acreditando que suas emoções são irrelevantes, que seus sentimentos são exagero, que sua presença é dispensável.
É viver invisível – mesmo estando o tempo todo ao lado de quem deveria enxergá-lo.
É possível quebrar esse ciclo?
Sim. A boa notícia é que a cura começa com o reconhecimento. Admitir que existe um espaço que precisa ser preenchido emocionalmente já é um passo importante.
Estar presente emocionalmente não exige perfeição. Não exige tempo integral. Mas exige intencionalidade. É sobre ouvir de verdade. Olhar nos olhos. Validar o que o outro sente. Pedir desculpas quando for necessário. Mostrar que há espaço para erros, aprendizados e afeto genuíno.
Brinquedos, passeios e uma rotina bem organizada têm valor. Mas nada substitui o gesto simples de dizer:
“O que você sente é importante para mim.”
Vamos conversar mais sobre isso?
Se esse texto fez sentido para você, compartilhe com outros pais, mães, cuidadores ou educadores. Falar sobre negligência emocional é urgente. Pequenos gestos, quando feitos com presença e afeto, podem mudar tudo.
E você? Como lida com a presença emocional no dia a dia com seus filhos?

Gestora pública, ex-secretária de Assistência Social e de Saúde em São Mateus. Líder cristã há 14 anos, palestrante de casais, estudante de Psicologia e pesquisadora em saúde mental. Atua com psicoterapia social no CAPS.